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O principal aprendizado sobre paternidade
#010 - E é mais simples do que parece

Criada com IA
Hoje trarei, por meio de exemplos, a PRINCIPAL premissa e aprendizado que tirei da paternidade. Espero que ao final você não só tenha entendido e concordado com ela, mas também tenha sido capaz de ver em exemplos e até se inspirar para agir.
Essa semana começarei a mesclar temas mais reflexivos e filosóficos com textos mais práticos. Essa edição #010 tem esse objetivo, pois na última edição compartilhei reflexões sobre a paternidade do ponto de vista mais reflexivo.
Antes de escolher A PRINCIPAL premissa, fiz uma lista de princípios e dicas que daria para pessoas que estão iniciando o desafio de educar outros seres humanos (serve também para aqueles que convivem com crianças).
A seguir encontra uma lista de dicas, mas uma delas é a base de tudo, leia e tente imaginar qual seria…
Não jogue suas emoções ou frustrações na criança, ela não tem nada a ver com seus problemas
Seja o exemplo - eles aprenderão o que você faz, não o que você fala
Não trate a criança como uma criança - olhe como um ser humano
Nunca invalide ou deboche de um sentimento
Imponha limites, você é o adulto, especialmente em temas de saúde e segurança
Não proiba tudo, permita também, se pergunte “por quê não?” ao pensar em proibir algo (muitas vezes é uma questão de ego sua)
Sempre cumpra sua palavra e nunca minta ou engane a criança
Crie acordos e antecipe o que vai acontecer - dê previsibilidade
Estão mais para princípios gerais do que dicas, pois as dicas práticas se utilizam de vários desses princípios.
Mas, se você fosse escolher UM apenas, qual seria?
Volta ali e escolhe um….
Não trate a criança como uma criança

Criada com IA
Essa é a base de tudo. Parece contraditório, mas vou explicar.
Primeiro, uma observação:
Vale lembrar que a base disso são apenas opiniões pessoais, não tenho embasamento teórico, apenas compartilho minha experiência caso ajude alguém. Avalie, não acredite em tudo e tenha discernimento.
Se eu tiver que resumir os 5 anos de experiência que tenho com eles e destilar todo o aprendizado, o principal seria esse: Não trate a criança como uma criança (ou um bebê como bebê).
O que quero dizer com isso?
Quer dizer que precisamos acreditar que a criança é um ser humano e merece respeito e atenção. Quer dizer que não é um “ser idiota” que não sabe nada e precisa ser tratado como tal. Pelo contrário, acreditamos que eles desde muito novos são capazes e inteligentes.
Falando assim parece óbvio, mas:
Toda vez que você faz algo pela criança que ela poderia fazer sozinha, você fere esse princípio;
Toda vez que deixa de conversar e se comunicar achando que ela não entende nada, você fere esse princípio;
Toda vez que você acha que é tudo “bobagem de criança” e “birra” apenas, sem validar e entender, você fere esse princípio;
Não é tratar como adulto, é reconhecer que a criança tem dificuldades sim, mas pensar e agir sem se limitar a elas.
Antes dessa experiência paterna eu provavelmente seguia a linha de tratar criança como criança. Aos poucos aprendi essa premissa básica e cada vez mais venho exercitando ela, então talvez esse texto te ajude a expandir essa visão também.
Para crescer, você precisa de estímulo

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Para crescer, você precisa de estímulo. E o estímulo é sempre um pouco além das suas capacidades atuais.
Tratar criança como criança é retirar os estímulos que elas precisam para se desenvolver.
Vou explicar com dois exemplos práticos a seguir.
Exemplo 1 - A criança pede água

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Imagine que a criança de 2 anos, que só bebe em mamadeira e peito, pede água. Ela pede no copo, pois é o que vê vocês, adultos, fazerem todo dia.
Agora imagine responder a isso com três cenários possíveis:
Cenário A: Você brinca dizendo “fulano, você ainda não sabe beber em copo e pode quebrar pois é periogoso”, ai enche a mamadeira de água pois é o caminho que ela já sabe e certamente vai conseguir. Certamente o caminho mais comum.
Cenário B: Você escolhe desafiar e estimular, pedindo que ela segure um copo para você encher de água. Você percebe que pode dar problema então prepara um copo de acrílico e um local que se molhar dá para limpar.
Ao tentar pegar o copo a criança derruba ele, pois ainda não tem coordenação motora completa. Você se irrita, dá uma bronca e vai limpar. Depois de limpar coloca a água na mamadeira para ela matar a sede enquanto você percebe que não deveria ter tentado aquilo. Volta, assim, ao caminho “normal” da educação, sem desafiar, sem saber lidar com as suas próprias frustrações.
Cenário C: Idem ao B, mas ao derramar o copo você vira para a criança e fala “caramba, molhou, não esperávamos por isso, né?”. “Vem aqui comigo me ajudar a pegar um pano para limparmos”.
Você pega o pano, um para você e um para a criança, e juntos arrumam tudo. Você enche outro copo de água e dessa vez segura a base do copo para evitar que isso aconteça de novo, percebendo que o desafio anterior foi alto demais.
A criança vai beber e no primeiro gole se suja toda, pois não tem a coordenação ainda para saber dosar. Você limpa a blusa dela, troca a roupa e enche novamente o copo.
Dessa vez, além de segurar a base do copo você auxilia a levar à boca e impede que vire demais.
Após um leve engasgo a sede está matada, e a criança fica super realizada por beber como vê você, ídolo ou ídola de sua vida, fazer todo dia. A sensação de ter feito junto e passado pelo desafio de limpar e persistir também aumenta sua autoconfiança.
Perceba que as lições se misturam, nesse exemplo entra o autocontrole do adulto também. Entender que a criança não derramou o copo “de sacanagem”.
Não tem como ter aprendizado sem sujeira
Para aprender e se desenvolver é preciso o erro, o caos, o imperfeito.
Exemplo 2 - Irmão tira da mão do outro brinquedo

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Esse aconteceu recentemente. Talvez você saiba, mas aqui em casa temos o Theo - de 5 anos - e o Vicente - de 2 anos. Se você conviveu com crianças na sua infância sabe que o conflito e as brigas fazem parte, né?
Theo estava tomando café da manhã com um urso de pelúcia sobre a mesa (Bob, o cachorro). Vicente acordou, foi lá na mesa e arrancou dizendo “o Bob é MEU Theo”. Obviamente, choro para todo lado. Como reagir a isso?
A Julia conduziu muito bem, vamos analisar três possíveis cenários também, do mais “senso comum” ao que acredito ser o melhor:
Cenário A: Você fala: “Theo, você já é grande, pára de choradeira, deixa de ser egoísta e empresta para seu irmão também, ele é pequeno e não entende ainda as coisas”. Obviamente o choro não pára e outras medidas vão sendo tomadas (brigar, gritar, bater).
Bom, tem tanta coisa errada que foi até difícil escrever esse parágrafo, mas reconheço que é um cenário bem dentro do senso comum (me responda depois o email me dizendo o que vê por ai).
Cenário B: No cenário B você atua como interventor. “Vicente, lembra que combinamos que não podemos tirar algo que a pessoa está usando da mão dela? Então, me dá aqui (arrancando da mão dele), vou devolver para o Theo e vou ver outro brinquedo para você poder brincar, tá? Theo viu filho pode parar de chorar, já tem o que queria de volta”.
Esse cenário você atua “salvando” as crianças e dizendo o que devem fazer (e até fazendo por elas), mas já partindo de um senso de justiça e um combinado prévio. Pode parecer o certo a fazer, mas ao agir por elas tiramos a possibilidade de estímulo ao crescimento.
Cenário C: O cenário C foi o que aconteceu de verdade e resolvi trazer e compartilhar, com algumas adaptações mas sempre dentro do que já praticamos.
O adulto intervém como mediador, mas sem tirar da criança a capacidade de autoregulação e resolução de conflitos:
— “Vi-cen-te!” - Fala alto a Julia ao ver, o que demonstra que a atitude foi incorreta e injusta.
Antes de continuar se direciona ao mais velho, demonstrando validar o sentimento dele e que viu que houve uma injustiça:
— “Theo, mamãe viu que estava com você e ele arrancou - o que foi injusto -, vou ajudar a dar o Bob de volta, ok?” Isso já acalma o choro do mais velho aos poucos, vendo que alguém percebeu a injustiça.
Enquanto se abaixa para falar com o Vicente ela completa:
— “O Bob é muito legal, né, e a mamãe entendeu que você quer muito brincar com ele” (perceba que está validando o sentimento dele também). “Mas, você sabe que é errado arrancar coisas da mão do irmão, né? Se você quer algo que está com ele você deve pedir ao Theo. Devolve a ele por favor e veja se consegue pedir para ele.”
— “NÃO” - Fala o Vicente se agarrando mais ao Bob (o cachorro de pelúcia)
Depois desse não o Theo volta a chorar, o que irrita mais o Vicente.
— “Crianças, a mamãe está vendo que os dois querem muito brincar com o Bob, né? Mas só tem um e o Theo estava usando antes, como podemos fazer com que todos consigam brincar? Theo, você consegue pegar um brinquedo e ver se o Vicente quer brincar e liberar o Bob para você?”
(Vou resumir pois o cenário pode ter muitas idas e vindas, mas, após muito diálogo, a Julia consegue conduzir o Vicente a devolver para o Theo e perguntar se ele empresta a ele. Como o Theo já estava mais calmo acaba emprestando. Depois de 10 minutos o café da manhã volta a acontecer).
Perceba que dá muito trabalho, mas, na base de toda essa construção do Cenário C o que aconteceu? Não tratamos a criança como criança, reconhecemos que tem sentimentos e capacidades inatas em resolver seus problemas e evoluir.
Então, para mim, tudo que leio ou aprendo sobre o que se fala de “educação positiva”, equilibrar firmeza com gentileza e etc, tem a ver com isso, não tratar criança como criança.
Não é difícil, mas dá trabalho

Especialmente no caso da briga de irmãos o Cenário C tem quase 10x mais palavras no diálogo do que o A. Só nisso já dá para perceber o trabalho que dá. Foi difícil? NÃO. Educar não é difícil, é trabalhoso, e requer que nós adultos reconheçamos as crianças como seres completos, capazes e inteligentes.
Educar não é difícil, mas dá trabalho (e requer que não tratemos crianças como crianças).
Não tem grandes dificuldades.
Porém, repetir 365 dias por ano que precisa dar bom dia ao porteiro, que tem que falar por favor para pedir algo, que tem que sentar na mesa com os pés para frente e comer com atenção…enfim, você sabe, a lista é infinita.
Essa atenção constante e dedicação permanente é o que diferencia. Pois não adianta ser um episódio, criança precisa de repetição e rotina.
O poder dos juros compostos

Lembre dos Cenários A, B e C.
O Cenário A é o “automático”, que talvez se veja em 80% por ai no mundo real. Não é uma crítica, ninguém acorda todo dia querendo fazer algo da pior forma, mas falta informação e percepção de outras formas de viver também.
O Cenário C, mais orientado pelo viés da criança, uma criação com maior autonomia, é mais raro de ser visto e normalmente dentro de uma “Bolha” social.
Os juros compostos, se você lembra da escola, são aqueles que ganham no longo prazo. O famoso “juros sobre juros”. Eu acredito que a educação é exatamente isso, a cada passo dado ajuda nos outros passos, e, com o tempo, temos a tal “boa conduta”, “boa educação”, ou como queira chamar.
Certamente não é um episódio apenas, é o acúmulo de mais de muitas ações diárias ao longo de muitos anos. Fazendo uma conta rápida: se em 5 anos dediquei 1h por dia e no mínimo 5 intervenções “pedagógicas” temos 1825 horas e 9125 decisões e interações.
Imagine um pai ou mãe que repetidamente age no Cenário A. Imagine como estará essa criança em 2 anos.
Imagina um pai ou mãe que repetidamente age no Cenário C. Imagine como estará essa criança em 2 anos.
Faz sentido pensar que o resultado ao longo de vários anos é potencializado pelos cuidados e esforço diário, assim como tudo que é construído na vida que tenha valor.
Recapitulando, para crescer a criança precisa de estímulo e desafios, e, para isso, precisa não ser tratada como um bebê, incapaz ou meramente “criança que não sabe de nada”.
Portando, relembrando:
Toda vez que você faz algo pela criança que ela poderia fazer sozinha, você fere esse princípio;
Toda vez que deixa de conversar e se comunicar achando que ela não entende nada, você fere esse princípio;
Toda vez que você acha que é tudo “bobagem de criança” e “birra” apenas, sem validar e entender, você fere esse princípio;
Espero que esse texto gere reflexão, mas, sobretudo, ação.
Faz sentido? Muito diferente do que acreditava ser verdade?
Me responda esse email com sua opinião..
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